segunda-feira, 14 de novembro de 2011

... com apenas um bilhete

Amelie Monselli, apaixonada – mesmo tão ferida – raras às vezes que deixara o amor em seu coração entrar, quase nunca – isso posso afirmar – amara verdadeiramente. Encontrava em seus livros uma terna paz que se encarregara de anestesiar a agitação interna e afastar pensamentos destrutivos da mente. O amor aparecera para Amelie tão forte e rápido quanto o vento que assoviava entre os galhos das árvores do parque, na fria manhã de outubro de 2008. Ela sentia seus dedos adormecerem dentro das luvas e via o gelo tornar-se mais denso sobre o lago da grande cidade. Pessoas no seu vai e vem, trabalho e casa, passeios e brincadeiras no gelo. Lá estava Amelie, apenas ela, sentada dentro de uma cafeteria, tentando se esquentar com grossos casacos, uma xícara de chá e um livro de suspense chegando ao fim.
Pobre mulher, já se contentara com seu amargurado coração inóspito de qualquer sentimento bom, já havia se preparado para voltar à sua casa quando uma forte rajada de vento desalinhara seus longos cabelos ruivos, trazendo de longe um cachecol azul – assim que saiu da cafeteria – ainda confusa, Amelie se assustou com o par de olhos azuis que a fitara assustados – tão azuis quanto o fundo de um oceano. Junto com o susto, ela sentiu seu corpo perder o equilíbrio e só não foi ao chão por causa do braço forte que sustentou seu corpo e a levou para o interior da cafeteria.
- Desculpe, a ventania conseguiu arrancar-me o cachecol das mãos e acabou que por levá-lo a você. Ah, eu sou Andrew – disse servindo uma água para Amelie.
Ainda entorpecida pelo susto, o coração da jovem batia a mil – nem tanto pelo susto – mas aquele rosto de sorriso jovial lhe pareceu conhecido de datas e, do seu íntimo, uma alegria, até então desconhecida, ganhava forças. Tudo o que ela queria era abraçar aquele moço desconhecido e sentir os problemas discernirem da mente.
- Não tem problema, eu entendo, o vento parece ficar mais forte a cada dia. Prazer. Chame-me de Amelie… – as palavras saíram suaves e restou silêncio, o olhar preso no do outro e Andrew sorriu.
- Olha Amelie, estava indo embora? Eu vim para essa cidade para visitar minha irmã, mas recebi uma ligação dela dizendo que iria dormir na cidade vizinha por causa do gelo nas ruas e agora estou sem companhia. Apreciaria muito a sua presença no almoço. O que me diz?
- Seria falta de educação de minha parte se recusasse, já que você me foi tão educado. Embora eu mal saiba quem é você, de fato, irei aceitar. Já tem algum lugar em mente?
- Hum… Não. Isso você é quem decide, eu ainda não andei pela cidade, cheguei ontem à noite. Enfim, eu vou para onde você me levar.
Amelie sorriu e baixou os olhos. Pegou um papel e anotou um endereço e disse?
- Me pegue às 19h nesse endereço. O lugar… É surpresa, uma das boas – falando isso pegou o casaco e foi embora.
Andrew ficou na cafeteria por mais algum tempo, pensando no que acabara de acontecer, no que sentira quando os olhos castanhos da mulher encontraram os seus, aqueles lábios desenhados e todas as palavras que saia da boca de Amelie (Ah! Que nome doce, tanto quando a dona). De súbito pulou da cadeira e foi para casa, já se passava das 14h. Agora chegara à hora de buscar Amelie, Andrew se surpreendeu com o quão ansioso estava, entrou no carro e seguiu para o endereço indicado. Chegando lá viu que se tratava de um centro comunitário que lidava com os problemas de crianças sem morada. Amelie saiu lá de dentro sorrindo e cantarolando, seu sorriso foi de canto a canto quando viu Andrew, entrou no carro falando:
- Nossa, como está frio haha. Boa noite, vamos, vou congelar aqui.
- Ei, você trabalha aqui, sério? – indagou Andrew
- Trabalho sim, no tempo vago. Algum problema? – disse ela fechando o cenho.
- Nenhum, minha mãe fazia o mesmo. Para onde vamos? – falou mudando de assunto.
- Para minha casa. É logo ali no fim da rua.
Andrew sorria, parecia se divertir com a situação. Não havia imaginado jantar na casa de Amelie, mas se via satisfeito com a surpresa da moça desconhecida. Chegando lá, entraram e Amelie foi correndo terminar o que tinha preparado e serviu vinho para o convidado
- Não se importa de esperar, não é?
- Só vou te pedir uma coisa. Não me embebede e não abuse de mim – os dois explodirem em gargalhada.
- Só um minuto… Já está pronto. Deixei tudo preparado antes de sair.
Eles se limitaram a comer no balcão da cozinha mesmo. Entre uma taça de vinho e o prato de comida foram se conhecendo – havia entre eles uma ligação indizível – eram 21h quando Amelie lavava os pratos e Andrew apenas a fitava da porta (seus olhos não desviaram um segundo da moça desde que chegara).
- O que foi, Andrew? Você ficou quieto agora – disse Amelie virando-se para ele – Por quê?
- Perdi a fala – ele chegou mais perto e pegou nas mãos dela – Nada mais tenho a falar. Posso ouvir você falando por horas, mas eu não quero dizer nada. Eu gostaria de poder te ver amanhã, o que acha? Você me divertiu muito hoje.
(Silêncio)
- Ei, o que foi? – ele quebrou o silêncio que se tornara incômodo.
- Você não pode fazer isso, para!
- Ora, fazer o que?
- Me fazer gostar de você para depois ir embora, me deixando de coração partido. É melhor você ir agora – ela abriu a porta da frente e pediu – Por favor.
- Você sente o mesmo, não é? – ele disse quase num sussurro esperançoso. E Amelie reforçou o pedido sem encará-lo.
Ele foi embora de cabeça baixa. Ela, por sua vez, bateu a porta e suspirou amargurada. No dia seguinte levantou cedo e foi para o centro comunitário – no seu silêncio se culpava por deixar Andrew dominar seus pensamentos na noite passada. Sentou em sua mesa e viu um embrulho com um bilhete:

Amelie,

Desculpe se dei a entender algo errado noite passada. Gostaria de me desculpar. Aceita almoçar comigo essa tarde? Eu tenho um lugar para levá-la. Por favor, é de coração. Eu passo para pega-la às 19h.

Andrew.

Sem ao menos perceber, Amelie sorria com as palavras – e com a atitude. Como podia se sentir daquele jeito? Seu coração queria sair pela boca e, sim, ela iria almoçar com Andrew, não só naquela tarde, mas, todavia, Amelie sentia que Andrew era quem a tiraria da loucura de paixões passageiras. Era quem ela esperava.

Letícia Durães

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